Bom de pique
No Campeonato Brasileiro de 1981, o Santa Cruz lutava por uma vaga para ir à segunda fase. Depois de ter dado uma goleada de 4 x 0 no Bahia, no Recife, voltaria a enfrentá-lo, em Salvador. Podia perder por uma diferença de até quatro gols para o Bahia, e mesmo assim continuaria na competição. O jogo seria na Fonte Nova, mas nem por sonho admitia-se essa possibilidade. Mesmo que o Bahia acertasse o pé, o Santa contava com Dario, o Peito de Aço, que tiraria a diferença. Qual nada! A Cobrinha levou um retumbante e inesquecível 5 x 0, até chorado pela sua torcida, e não se classificou.
Descontentes e envergonhados com a goleada, membros de uma torcida organizada resolveram manifestar seu repúdio, fazendo o enterro simbólico da diretoria. Vários caixões foram encomendados. Pelo que foi programado, o da frente seria o do dirigente Rodolfo Aguiar. Enquanto se organizava o ‘enterro’, que seria num domingo, um dos líderes do grupo, o conhecido chefe de torcida Geraldo Arruda, tratou de tomar suas precauções, uma vez que havia a possibilidade de a direção do clube mandar alguns capangas acabarem com a brincadeira.
Por sugestão de Ricardo Antunes, hoje jornalista e empresário da área de marketing político, na época, chefe de uma das facções da torcida tricolor, foi contratado em Camaragibe, cidade da Região Metropolitana do Recife, um negrão do tipo guarda-roupa, uma verdadeira montanha de músculos. Por via das dúvidas, o segurança chegou ao Arruda no sábado, na boquinha da noite, apresentando-se na sede das Torcidas Organizadas, à Rua das Moças, a dez metros do clube. Ao ver aquele monumento de carne e osso, a turma respirou aliviada, certa de que ninguém teria coragem de molestar os participantes do ‘enterro’.
Trataram logo de levar o segurança para a Churrascaria Colosso, localizada no estádio tricolor, o Mundão do Arruda, Embora alegasse fastio, o gigante devorou um galeto completo, acompanhado de 13 refrigerantes. Mais tarde, perto da hora de dormir, sentiu fome novamente. Foi fácil comprar, na feira do Arruda, ali pertinho, umas bananas, que o homem comeu com muito apetite, acrescidas de alguns pães e uns dois litros d’água.
Já no domingo, no café da manhã, o protetor dos torcedores corais deu conta de três pratos de macaxeira, três copos de café e uns 400 gramas de charque. E a turma arrumando o cortejo fúnebre. Na hora do almoço, o mesmo apetite. O bichão traça outro galeto, acompanhado de uma quina de Coca-Cola, ou seja, cinco garrafas.
Lá para as tantas, perto de o ‘féretro’ sair, o negão sentiu uma agonia no estômago. O jeito foi Geraldo Arruda (ou do Arruda? Ele praticamente mora lá) socorrê-lo, levando-o a uma barraca de cachorro quente, onde ele fez novo ‘estrago’. “Ainda bem que esse comelão não vai durar muito com a gente”, pensou Geraldo, àquela altura, já arrependido de tê-lo contratado.
Na hora da saída da mórbida passeata, houve o cuidado de untar o homem, da cabeça aos pés, com óleo de cozinha, para que ele se tornasse inagarrável, caso houvesse a investida de algum ‘cabra’ da diretoria do clube.
Mal o ‘enterro’ deu os primeiros passos, o pau quebrou na Rua Bolívar, diante do clube, e haja caixão de defunto para todo lado. Aflitos, os promotores do evento procuraram por seu segurança, pois queriam se proteger. Segurança? Pois sim. Só deu para ver aquele corpão escuro, a mais de mil, tomando o rumo da Avenida Beberibe e sumindo no meio do mundo.
Pelo menos, energia tinha pra correr, depois de ter sido cevado pelos rebelados torcedores do Santinha
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